Professor da Universidade Federal de Pernambuco desenvolve nos Estados Unidos modelo inédito para a áudio-descrição científica de insetos

Dr. Francisco Lima, 54, docente da Universidade Federal de Pernambuco, em pesquisa de pós-doutoramento junto ao National Museum of Natural History Smithsonian Institute, em Washington DC, desenvolveu um método inédito de tradução visual que une a descrição científica de artrópodes com as técnicas e diretrizes tradutórias da áudio-descrição[1], recurso utilizado para que pessoas com deficiência visual tenham acesso às imagens, como em figuras, fotografias, vídeos, e outras configurações.

À direita da fotografia, em pé, o Professor Francisco segura com a mão direita um bloquinho de resina, dentro do qual está preservado um besouro. À esquerda, parcialmente oculto pelo corpo do professor, há um banner apresentando a fotografia colorida da abelha europeia, Apis mellifera. Acima do bolso esquerdo da camisa do professor, há um bottom do SnapSects.
Foto do Professor Francisco Lima junto de um banner em que se lê: Morfologia Externa de Artrópodes.

O Prof. Francisco Lima explica que biólogos, entomólogos, pesquisadores, de laboratório ou de campo, têm descrito os insetos e outros artrópodes há muito tempo, valendo de chaves taxonômicas e descritivos específicos que permitem a identificação e classificação daqueles organismos.

Todavia, ele considera que isso não tem sido suficiente para aproximar o público leigo da ciência ou dar a conhecer a diversidade biológica à população que ainda vê insetos e aracnídeos como algo a ser eliminado, assim que é visto.

Por outro lado, o pesquisador ressalta que tem havido um grande esforço para tornar os fenômenos visuais, que estão costumeiramente indisponíveis às pessoas com deficiência visual, acessíveis por meio de palavras escritas, sinalizadas ou oralizadas.

Fotografia colorida de uma barata Madagascar, exibida na palma da mão do professor Francisco. Vê-se o par de antenas pretas do inseto, o dorso preto do tórax, com duas das seis pernas e o dorso alaranjado do abdômen. Nas laterais do abdômen, em cada segmento, há um pequeno ponto preto, chamado espiráculo.
Foto colorida da barata Madagascar.

Segundo o professor, o recurso que torna as imagens acessíveis às pessoas cegas ou com baixa visão é a áudio-descrição. Esse recurso assistivo teve origem nos Estados Unidos, com Gregory Frazier (1975), em São Francisco, e com Margaret R. Pfansteihl (1980), em Washington DC. Rapidamente esse recurso tornou-se uma tecnologia para o acesso das pessoas com deficiência visual aos conteúdos imagéticos de peças teatrais, de filmes e arte em geral.

A pesquisa do Dr. Lima une as diretrizes da áudio-descrição com a descrição científica de artrópodes, de modo que cientistas e tradutores visuais possam, agora, tornar acessíveis os fenômenos visuais da entomologia a estudantes, professores e pesquisadores com deficiência visual, propiciando com que também esta área da ciência esteja acessível a todos, independentemente de enxergarem ou não. Nas palavras do professor: “a beleza que a biodiversidade apresenta aos olhos de quem enxerga não pode ser negada aos dedos e aos ouvidos de quem não vê”.

O modelo de áudio-descrição científica proposto pelo estudioso tem a função de diminuir, senão eliminar, a lacuna deixada pela ciência e pelos próprios educadores de pessoas com deficiência visual no que tange a viabilizar o acesso das pessoas com deficiência visual ao conhecimento científico, principalmente nos campos da biologia, entomologia, ecologia e da biodiversidade em geral.

O modelo de áudio-descrição científica que o cientista brasileiro desenvolveu nos Estados Unidos, em um dos museus de entomologia mais importantes do mundo, o National Museum of Natural History Smithsonian Institute, recebeu apoio da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), teve a supervisão do Ph.D Sean Brady, chefe do Departamento de Entomologia do NMNH, e contou com as consultorias da mestre em biologia Thais Lima e do Prof. Dr. Pitágoras C. Bispo, da Universidade Estadual Paulista (UNESP).

Premiação

De pé, trajando terno preto sobre camisa azul claro e gravata vermelha, o professor Francisco segura a placa de premiação Barry Levine. Deitada, junto ao pé esquerdo do professor, a cão-guia Okra, de arreio e faixa verde e amarela, volta-se para trás. Okra é uma Labrador preta, de pelos brilhantes.
Foto do Professor Francisco, recebendo premiação da ACB/ADP.

O estudo, que se deu no período de março de 2017 a fevereiro de 2018, rendeu ao Professor Francisco Lima o Prêmio Dra Margaret Pfanstiehl Memorial em Áudio-descrição – Pesquisa e Desenvolvimento, em julho de 2018, conferido pelo American Council of the Blind/Audio Description Project. Esta foi a segunda láurea alcançada pelo professor, que é também formador de áudio-descritores e o único brasileiro a fazer parte do Audio Description Advisory Committee, da Academy for Certification of Vision Rehabilitation and Education Profissionals (ACVREP).

Em 2016, o professor recebeu, também da ACB/ADP, o Prêmio Barry Levine Memorial Award for Career Achievement in Audio Description.

Desdobramentos

O estudo realizado pelo Professor Francisco Lima gerou um modelo de áudio-descrição apropriado para a provisão de acessibilidade comunicacional aos elementos visuais relativos aos artrópodes, por exemplo, aqueles disponíveis em museus, em laboratórios de biologia e em livros de biologia, na forma de organismos preservados, modelos educacionais, cartões museológicos, ilustrações, fotografias, desenhos e outros.

Para o cientista, “meia acessibilidade não é acessibilidade. As pessoas com deficiência não podem ser tratadas como meio cidadãos ou meio contribuintes. Indivíduos com deficiência são cidadãos plenos dotados de todos os Direitos Humanos relativos aos seres humanos”.

Foi com esse entendimento que o professor Lima, que é cego, se uniu ao programador Luiz Eduardo Porto Mariz, também cego, para, por meio de um aplicativo, tornar o modelo de áudio-descrição científica uma ferramenta acessível e inclusiva que pudesse ser usada por cientistas, áudio-descritores, professores, estudantes e demais interessados na entomologia e na biodiversidade em geral.

Assim, entre os meses de setembro de 2017 e fevereiro de 2018, o professor e o programador desenvolveram o SnapSects, “… uma ferramenta para a classificação taxonômica e descrição científica de artrópodes, a qual constitui um recurso educacional para ensinar/aprender sobre a biodiversidade e os aspectos anatômicos visuais ou a morfologia externa daqueles organismos. SnapSects é um aplicativo interativo para dispositivos móveis, útil durante a coleta e/ou descrição científica de artrópodes, tornando-os acessíveis às pessoas cegas ou com baixa visão, por meio da áudio-descrição.

No período de setembro de 2018 a abril de 2019, o aplicativo, que vinha recebendo frequentes ampliações, ganhou ainda mais recursos educacionais. Assim, o SnapSects original passou a ter três versões: SnapSects Academic, SnapSects School, e o SnapSects Web.

A versão SnapSects Academic é voltada principalmente para uso de pesquisadores e professores de biologia, entomologia e áreas afins. Os professores poderão disponibilizar cursos, disciplinas, sugerir bibliografias para leitura, e propor exercícios, aos moldes do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).

A versão School é principalmente destinada aos estudantes, que poderão praticar a classificação taxonômica e a descrição científica dos artrópodes, em trabalho de campo ou no laboratório, inscrever-se em cursos (fazer disciplinas), e resolver exercícios propostos.

A versão SnapSects Web conjuga os recursos da versão SnapSects Academic com a possibilidade de publicação de fotografia de artrópodes em um reservatório de imagens com áudio-descrição científica, a ser disponibilizado à pesquisa pelo público em geral.

Todas essas versões estarão disponíveis gratuitamente para os sistemas android e IOS, com acessibilidade para uso pleno por parte das pessoas cegas ou com baixa visão.

As versões SnapSects School e SnapSects Academic contam com comando por voz e por gestos, o que permite a acessibilidade de pessoas com deficiência física ou com limitação motora.

Ações

O Professor Francisco Lima diz que o trabalho hora apresentado está longe de terminar, mas que é momento de a comunidade, geral e científica, ter acesso ao material produzido, até mesmo como uma forma de agradecimento às abnegadas contribuições de parceiros e colaboradores voluntários, alguns dos quais preferem não ser nomeados.

Além disso, conclui o professor, “há muitos jovens com deficiência visual que vão prestar o Enem, e uma ferramenta como o aplicativo SnapSects pode ajudar esses alunos a se preparar para tão importante certame. Mas para isso, os professores precisam se conscientizar de que a inclusão dos alunos com deficiência depende da atitude proativa dos docentes”.

Neste 19 de junho 2019, no Centro de Educação, da Universidade Federal de Pernambuco, começa a primeira ação de divulgação dos dados da pesquisa e do aplicativo dela derivado.

Das 14h às 16h, no auditório Carlos Maciel, o Prof. Francisco Lima profere a palestra “Desenvolvendo um modelo de Áudio-descrição Científica para artrópodes: um estudo no National Museum of Natural History Smithsonian Institute, USA”.

Das 16h às 19h, também no CE/UFPE, no Anfiteatro Iracema Lima Ferreira, ocorrerá a I Exposição da Morfologia Externa de Artrópodes.

Das 19h30 às 21h, no auditório do CE, o Prof. Francisco e convidados apresentarão a mesa redonda SnapSects: como desenvolver um aplicativo para a áudio-descrição científica de artrópodes, acessível para pessoas cegas, com baixa visão, com deficiência física e outras”.

.

Em um triângulo cinza, com borda amarela, há uma figura estilizada de um artrópode, cuja cabeça é formada por um semicírculo branco, com dois pequenos círculos cinza, os quais representam olhos compostos. O tórax da figura é formado por uma gota branca, de cujos lados partem, um de cada lado, semicírculos vermelhos, representando um par de asas, que se estendem em direção ao abdômen, e dão à figura a aparência de uma joaninha. O abdômen é formado por um círculo branco, em cuja porção final há um pequeno triângulo sombreado, o qual lembra um ferrão, como em uma abelha. Margeando a parte esquerda do tórax e a parte direita do abdômen, uma linha preta forma a letra S. Abaixo da figura do artrópode, um pequeno retângulo amarelo dá ao triângulo o formato de um A maiúsculo. Sob o triângulo: SnapSects. O primeiro e segundo S de SnapSects são maiúsculos.
Logotipo do SnapSects

Próximos Passos

Depois desta primeira apresentação, o professor pretende visitar museus, universidades e demais instituições interessadas, a fim de formar tradutores visuais, para que possam trabalhar com áudio-descrição científica de artrópodes; e treinar pesquisadores, professores e estudantes, para que possam fazer melhor uso da ferramenta SnapSects.

Dr. Francisco Lima espera, ainda, levar a Exposição da Morfologia Externa de Artrópodes com áudio-descrição para centro culturais, shopping centers e outros lugares públicos, que possam acolher a ação.

Contatos

Email: limafj.us@gmail.com
Cel.: (81) 98297 – 9339

  • [1] Grafia em conformidade com a base XV do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

Publicado por